terça-feira, janeiro 30, 2007

Na opinião de...

Há que pensar a campanha que aí está e que promete ainda maior dramatização no que respeita ao referendo sobre o aborto. Devo dizer, desde já, que considero todo este frenesim uma das manobras mais bem orquestradas de desvio da atenção das questões essenciais que avassalam o País e a governação.
Durante três meses tornou-se pouco relevante qualquer questão estratégica e o palco foi dado a um epifenómeno que, sendo uma questão dos nossos dias, bem poderia ter outra decisão. O problema é tão simples quanto isto.
Se o PS é a favor da despenalização, se o primeiro- -ministro leva esta questão a sério, e tenho fortes dúvidas de que a leve mesmo a sério, teria bastado que a Assembleia da República votasse a despenalização e o caso estava arrumado. Tendo em conta que os partidários do ‘sim’ afirmam que o ‘sim’ é a tolerância para fazer, ou não fazer, uma prática abortiva, maior espaço de manobra teria a maioria socialista para despachar com a sua maioria absoluta uma decisão que, por esta forma, vai custar milhões ao País na medida que, em termos formais, a realização de um referendo obriga à mesma mobilização de meios de qualquer acto eleitoral.
Chegados aqui, voltemos ao princípio. Então se o primeiro-ministro quer efectivamente a despenalização, se o PS quer a despenalização, se a maioria absoluta confere legitimidade para tudo e mais alguma coisa, que raio de razão leva o poder a propor um referendo sobre esta matéria? O argumento mais hipócrita é de que esta decisão é do foro individual e excede a competência dos partidos. Mas não foi sempre? Quer agora quer depois, caso vença o ‘sim’? É tão do foro individual como qualquer outra decisão que parta do cidadão para o exterior, como fazer um empréstimo para comprar uma casa, fazer sexo, comer, dormir, trabalhar.
Soube-se esta semana que o Banco de Portugal já vendeu metade das suas reservas de ouro. Sabe-se que as grandes empresas continuam a deslocalizar-se para os antigos países socialistas e que o desemprego se mantém a níveis astronómicos. O fecho de escolas continua implacável, as maternidades é aquilo que se viu, a Segurança Social ameaça cada vez mais os futuros reformados. Quanto à reforma administrativa estamos conversados e as medidas anunciadas do Simplex não passam de meras aspirinas para doença grave.
Dois anos após as eleições e algumas operações de cosmética financeira, aquilo que o Governo tem mais à mão para que ninguém se recorde da grave crise que nos afecta é a ideia de um referendo. É conveniente e, simultaneamente, revela medo. Conveniente porque o pagode está entretido em intermináveis discussões sem nenhum argumento novo em relação à discussão de há oito anos, medo porque se o empenho do PS neste problema fosse sério resolvê-lo-ia através do mandato absoluto que o povo lhe entregou. Não é um referendo. É apenas um longo intervalo nas expectativas geradas pelo poder absoluto que nos governa.
Francisco Moita Flores, Docente Universitário

2 comentários:

Professor disse...

Ó Pedro, esta questão do referendo é mesmo, como diz Moita Flores, uma fuga para a frente.
Prometeu tanta coisa enquanto candidato, o nosso Sócrates, e a tudo faltou. Mas a co-incineração e o referendo têm de ser levados até ao fim! Ele há cada teimoso

JSD disse...

Também me parece, tanto mais que foram produzidos projectos-lei de membros afectos à sua bancada que visavam terminar de imediato com a penalização das mulheres...